O silêncio da fábrica, o ruído do dinheiro e o rasto da corrupção.

•Com as adaptações de Poeta Ukwanana.

A Nova Cimangola, apresentada em 2017 como um marco da industrialização angolana após um investimento público superior a 400 milhões de dólares, encontra-se hoje silenciosa, sem produzir um único grama de clinquer. O que à primeira vista parece falha técnica é, na verdade, segundo fontes internas e documentação consultada, o resultado de uma estratégia calculada que visa beneficiar interesses privados em prejuízo total do Estado.

A denúncia aponta o General José Tavares Ferreira como o articulador central de um alegado esquema milionário de importação de clinquer. A operação teria como braço executivo o PCA da Nova Cimangola, Agostinho da Rocha Fernandes da Silva, ex-governador de Luanda, do Bengo e de Cabinda. A sua nomeação para a presidência da fábrica, segundo apurámos, não foi mérito técnico, mas sim a garantia de que o esquema teria cobertura interna. É apontado como testa-de-ferro do general.

A fábrica reestruturada para produzir clinquer está parada desde o ano passado. As máquinas avariaram-se. A manutenção nunca foi feita. Mas esta ausência de manutenção não é descuido. Fontes internas descrevem-na como uma decisão intencional, programada, orientada para provocar a paralisação total da unidade e justificar a importação da matéria-prima. A importação, por sua vez, é onde reside o negócio milionário.

O General Tavares, que mantém relações consolidadas com fornecedores chineses, realizou diversas viagens à China ao longo dos últimos meses, onde assinou contratos volumosos de fornecimento de clinquer. Cada tonelada importada representa prejuízo duplicado para o Estado: perde-se aquilo que deveria ser produzido localmente e paga-se caro a fornecedores externos, enquanto a elite responsável pela sabotagem enriquece.

A fábrica roubada ao povo

A Nova Cimangola foi financiada com dinheiro público para garantir independência industrial. Era suposto fornecer clinquer a todo o país, estabilizar o mercado e reduzir os preços do cimento. Nada disso aconteceu. Hoje, a fábrica está reduzida à condição de armazém. Não produz. Apenas recebe navios vindos da China carregados de clinquer adquirido em contratos opacos.

O país perdeu uma das suas maiores unidades de produção de cimento por causa de um esquema montado dentro da própria estrutura estatal. O combate à corrupção, tantas vezes proclamado, está a ser derrotado dentro das próprias instituições que deveriam ser modelos de transparência.

A sombra de Mara Quiosa e a rede de influência

O PCA Agostinho da Rocha foi empurrado para cargos estratégicos durante anos. A sua ascensão foi facilitada pela sobrinha, Mara Quiosa, que enquanto governadora tinha como prática reposicionar familiares em postos de poder. Esta relação familiar fortaleceu a blindagem e permitiu que o esquema evoluísse sem contestação interna.

O General Tavares precisava de alguém confiável dentro da fábrica para assegurar que a paragem da produção fosse vista como inevitável. Agostinho da Rocha cumpriu esse papel com precisão.

Perguntas que o Estado precisa de responder imediatamente

Por que razão uma fábrica de 400 milhões de dólares está sem produzir clinquer?

Quem autorizou os contratos de importação assinados na China?

Onde estão os relatórios de manutenção e por que não foram executados?

Quem beneficia financeiramente com a paralisação da fábrica?

Por que o Ministério da Indústria e Comércio não intervém?

A Procuradoria-Geral da República vai investigar ou manter o silêncio cúmplice?

Que explicações o PCA Agostinho da Rocha e o General José Tavares podem dar ao país?

Por que razão o combate à corrupção não entra onde realmente dói: nos monopólios, nos generais, nas fábricas públicas?

A hipocrisia exposta

A Nova Cimangola deveria ser símbolo de soberania industrial. Tornou-se símbolo da captura do Estado por elites militares e políticas. O país paga mais caro pelo cimento porque alguém decidiu que manter máquinas avariadas é mais rentável do que produzi-lo localmente.

A fábrica que deveria gerar riqueza para Angola está, hoje, a enriquecer apenas dois homens: o General José Tavares Ferreira e o seu braço executivo, Agostinho da Rocha Fernandes da Silva.

Este esquema não é apenas corrupção. É um atentado económico. É uma sabotagem deliberada ao interesse nacional. É a prova de que a luta contra a corrupção está a ser derrotada pelos que operam nas sombras do poder.

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