A política e médica angolana Irene Neto é fruto do “pecado” de Agostinho e de Maria Eugénia Neto. Nasceu a 26 de Julho de 1961, com o cartão de militante do MPLA apensado à sua Certidão de Nascimento. Foi amamentada com discursos. Adormeceu ao som de comícios. Aprendeu a marchar antes de andar. Cantava o hino antes de conhecer o alfabeto. Sabia o nome do secretário-geral do partido no poder antes de saber escrever o seu. Resumindo: É uma militante de berço, com legitimidade para dizer que “o rei vai nú”, com todas as vogais e consoantes.
Irene Neto é mansa como o mar, mas quando se zanga, vira tempestade tropical. Quando critica, não levanta a voz. Mas causa um desconforto político danado. Há uns anos apelidou o presidente emérito do MPLA de Bokassa, o homem que governou a República Centro-Africana com mão de ferro e fomentou a corrupção naquele país africano.
Há dias, Irene Neto voltou a rodar a baiana e a enfrentar o presidente do MPLA. Mostrou a sua força e raça. Expôs as farpas que tem na alma. A política de “berço e tacho” pôs a nú a crise hipócrita e silenciosa que se instalou no partido no poder. Revelou que a actual direcção está toda à toa. Que o seu líder tem autoridade de estagiário. E que o Presidente da República mandou riscar o nome do seu consorte, o empresário Carlos São Vicente, da lista de cidadãos recentemente indultados.
Irene Neto teve a coragem de dizer o que a maioria dos angolanos já sabe, mas não tem coragem de denunciar: A interferência do Presidente da República em assuntos que deveriam ser da inteira e exclusiva responsabilidade do Poder Judicial. Por outras palavras: Chamou o Presidente da República de carcereiro do empresário Carlos São Vicente. Disse mais: O Poder Judicial está sob a bota do Executivo. E que Carlos São Vicente é prisioneiro privado do Presidente João Lourenço. Pancada! Pancada de dentro dói mais. Pois dói!
Christo Brand foi um dos carcereiros de Nelson Mandela na prisão de Robben Island. Ele escreveu um livro sobre o primeiro presidente negro da África do Sul. Eis o título: “Mandela — Meu Prisioneiro, Meu Amigo”. Quando em 2027 Sua Excelência desamparar o Palácio da Cidade Alta, também poderá escrever um livro sobre o seu prisioneiro particular. Tem tudo para tal. Título? Eis a minha sugestão: “São Vicente — Meu Prisioneiro, Meu Inimigo”.