Para dar algum fundamento ao seu propósito de restringir o consumo de bebidas alcoólicas no País, o Executivo recorreu a estudos do Instituto Nacional de Luta Anti-Drogas (INALUD), referentes ao ano de 2022, de acordo com os quais entre Janeiro e Dezembro daquele ano “7.305 (sete mil, trezentos e cinco) casos de pacientes deram entrada no Banco de Urgência do Hospital Psiquiátrico de Luanda por coma alcoólico” e naquele mesmo período teriam sido registados, não se sabe por que entidade, “20.437 (vinte mil, quatrocentos e trinta e sete) casos de consumo excessivo de bebidas alcoólicas a nível nacional”.
Não há, no estudo do INALUD, qualquer referência ao número de angolanos que teriam morrido por cirrose hepática por causa de excessos etílicos.
Também não há no estudo, no qual o Executivo se apoia para restringir o consumo de bebidas alcoólicas, qualquer referência ao número de angolanos que, naquele ano, morreram ou foram parar a hospitais por causa de doenças como cólera, malária, diarreia aguda e outras.
Numa clara manobra de distração, o Executivo, com a cumplicidade de deputados, sobretudo do MPLA, quer transformar a bebida alcoólica na principal responsável pela elevadíssima taxa de mortalidade no país.
Da proposta de Lei sobre o Consumo de Bebidas Alcoólicas que o Executivo submeteu à Assembleia Nacional, pode inferir-se que a cirrose hepática será a principal responsável pelas centenas de funerais que se realizam diariamente em Luanda. Ou seja, pelo país inteiro milhares de angolanos tombam diariamente porque os respectivos fígados foram completamente estourados pelo álcool.
Enquanto o Executivo, com a cumplicidade do Parlamento, entretém os angolanos com conversa fiada, um expediente muito útil para disfarçar a incompetência, a maior parte dos angolanos continua a não ter acesso a água potável e vive em condições insalubres.
Ao longo do canal do Kikuxi aumentou assustadoramente o número de pontos de girafas, a partir dos quais camiões cisternas se abastecem de água bruta vendida em grande parte de Luanda.
As pessoas que vivem ao longo do canal do Kikuxi defecam e despejam nele os seus dejectos.
O Ministério da Energia e Águas não é, garantidamente, alheio a esse assustador aumento das designadas girafas.
Estranhamente, ao invés de se concentrarem nas verdadeiras causas que encurtam a esperança de vida dos angolanos, deputados perdem tempo com questões periféricas.
Enquanto os deputados são entretidos com “miudezas”, o Governo continua a esbanjar o que já não chega para os mínimos olímpicos. Depois de se endividar junto da França para construir mais um satélite, na semana passada o ministro dos Transportes anunciou outra extravagância do Executivo: o lançamento, já em Fevereiro, de um concurso internacional para a construção de um corredor ferroviário ligando a província angolana de Moçamedes à Namíbia.
A empreitada anunciada pelo ministro Ricardo de Abreu suscita de pronto uma questão: qual é o volume de trocas comerciais entre os dois países que justifica a construção de um corredor ferroviário? O quê é que Angola compra ou vende à Namíbia que não possa ser transportado por estrada?
GRAÇA CAMPOS